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4 de ago. de 2012

[Conto] RUBEM FONSECA / Os Músicos



     por Pedro Luso de Carvalho


RUBEM FONSECA, natural Juiz de Fora, MG, nasceu em 11 de maio de 1925. Formou-se em Direito na cidade do Rio de Janeiro, onde, por alguns anos, exerceu o cargo de Inspetor de Polícia, função pública da qual se exonerou para dedicar-se à literatura. Como contista e romancista teve sua obra publicada em vários países, em muitos deles, como ocorreu no Brasil, recebeu inúmeros prêmios literários, como reconhecimento de sua obra, tanto pelo público como pela crítica especializada.

O professor de Literatura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Sergius Gonzaga, discorre no seu livro Curso de Literatura Brasileira (Editora Leitura XXI, Porto Alegre, 2004, 1ª edição) sobre a obra de Rubem Fonseca, dizendo que o escritor começou sua carreira na década de 1960 com a publicação de dois livros de contos, e que somente na década de 1970 sua obra começou a ter repercussão. Diz, a seguir, que, ao lado de Dalton Trevisan, ajudou a revolucionar a história curta no país.
         
           Preleciona Sergius Gonzada: A novidade temática e formal da obra de Rubem Fonseca logo seduziu o leitor brasileiro e mesmo o do exterior. E com razão. Contos como A força humana, Gazela, A coleira do cão, Corações solitários, Onze de março e O buraco na parede são, entre outros, legítimas obras-primas. De seus romances, destacam-se O caso Morel e A grande arte, que estão entre os títulos mais expressivos da ficção brasileira pós 1970. Outros – afirma Sergius Gonzaga -, como Agosto, Vastas emoções e pensamentos imperfeitos e Bufo & Spallanzani, ainda que não sejam obras fundamentais, possibilitam uma leitura agradável.
         
        O estilo despojado, por vezes elíptico – prossegue Sergius Gonzaga -, os diálogos convincentes, o experimentalismo formal e o realismo com que Rubem Fonseca revela e interpreta a vida urbana brasileira forma logo imitados. É hoje o escritor que mais tem seguidores no país. Gonzaga conclui: A maioria destes, contudo, não possui a mesma inspiração, caindo na banalidade jornalística, na fotografia gratuita da violência ou em um vulgar gosto pela morbidez.

            O conto intitulado Os músicos, que segue, é um dos dezenove contos que compõem o livro Lúcia McCartney, de Rubem Fonseça, que teve a sua primeira edição em 1970 (In FONSECA. Rubem. Lúcia McCartney. 5ª ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1987, p. 177-178):


                                    [ESPAÇO DO CONTO]

                                            OS MÚSICOS
                                                                                               (Rubem Fonseca)


  Faz calor. Os grandes espelhos da parede vieram da Europa no fundo do porão; cristal puro. “Tua avó fez risinhos e boquinhas, namorou dentro desse espelho”. Respondo: “minha avó nunca viu esse espelho, ela veio noutro porão”. Nesse instante chegam os músicos, três: piano, violino, bateria; o mais moço, o pianista tem quarenta anos, mas é também o mais triste, um rosto de quem vai perder as últimas esperanças, ainda tem um restinho mas sabe que vai perdê-las num dia de calor tocando os Contos dos Bosques de Viena, enquanto lá embaixo as pessoas comem bebem suam sem ao menos por um instante levantar os olhos para o balcão onde ele trabalha com os outros dois: Stein, no violino – cinquenta e seis anos, meio século atrás: espancado com uma vara fina, trancado no banheiro, privado de comida “nem que eu morra você vai ser um grande concertista” e quando Sara, sua mãe, morreu,  ele tocou Strauss no restaurante com o coração cheio de alegria – Elpídio na bateria, cinquenta anos, mulato, coloca um lenço no pescoço para proteger o colarinho, o gerente não gosta, mas ele não pode mudar de camisa todos os dias, tem oito filhos, se fosse rico - “fazia filho na mulher dos outros, mas sou pobre e faço na minha mesmo” - e todos começam, não exatamente ao mesmo tempo, a tocar a valsa da Viúva Alegre. Na mesa ao lado está o sujeito que é casado com a Miss Brasil. Todas as mesas estão ocupadas. Os garçons passam apressados carregando pratos e travessas. No ar, um grande burburinho.


                                                                
                                                               *  *  * 

2 comentários:

  1. Não conheço a "Valsa da Viúva Alegre". Vou procurar.
    beijos!!!

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  2. Familiarizei-me, com Rubem Fonseca, há uns 10 anos, lendo-0 em livros emprestados. Por incrível que pareça retirados de uma biblioteca municipal de uma escola pública de minha cidade. Eram todos bem novinhos, nunca haviam sido manuseados pelos alunos. Deliciei-me e, hoje, de vez em quando releio alguns contos dele.

    Não conhecia Os Músicos.Gostei, muito.

    Um abraço

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Pedro Luso de Carvalho