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30 de mai. de 2012

[Conto] CYRO MARTINS – Fim de Batalha

           

                 por  Pedro Luso de Carvalho


         CYRO MARTINS (Cyro dos Santos Martins), nasceu em Quaraí, RS, a 05 de agosto de 1908. Em 1933, formou-se em medicina. Escolheu como especialidade médica a psiquiatria e a psicanálise. Um ano após a sua formatura, passou a dividir a medicina com a literatura.   

      Em 1934 extreiou na literatura com o livro de contos "Campo Fora", com a temática gauchesca. Na  5ª edição dessa obra, publicada em 1991 pela Editora Movimento, coube ao culto ensaísta Guilhermino Cesar fazer sua apresentação, da qual extraímos o trecho que segue: 

        "Cyro Martins, em sua estréia em 1934, com os contos regionais de 'Campo fora', trouxe ao gênero uma perspectiva social que todos os críticos têm valorizado; e sob este ângulo é que, no futuro, será ainda lembrado, quando todas as 'modas' de hoje estiverem esquecidas.  Mas a meu ver, há nele um traço que o singulariza entre seus companheiros, tão importante, afinal, como sua temática: o modo de narrar”.

      Guilhermino Cesar diz mais: “E isso importa muito porque 'o modo e o como', antes de qualquer outra consideração, sobrenadam sempre. Aliás, por essa linha é que se afere do mérito de um escritor. Que é feito  da temática de Alencar? Onde ficou a denúncia de Lima Barreto? Onde se oculta, em que blocos da ideologia, o sertanismo de  Bernardo Guimarães? Ora meus caros, o que sobrou de todos eles é justamente o 'modo e o como'”. 

         Pincipais obras de Cyro Martins: (contos) Campo fora, 1934;  A entrevista, 1968;  Rodeio, 1976;  A dama do saladeiro, 1980; (novelas) Um menino vai para o colégio, 1942; Um sorriso para o destino; (romances) Sem rumo; 1937; Enquanto as águas correm, 1939; Porteira fechada, 1944; Estrada nova, 1954; Sombras na correnteza, 1979; O príncipe da vila, 1982; Gaúchos no obelisco, 1984; Na curva do arco-íris, 1985; O professor, 1988.
       
        Cyro Martins faleceu a 15 de dezembro de 1995, em Porto Alegre.

        Segue o conto “Fim de batalha”, que integra o livro de contos  de Cyro Martins,  Campo fora, (In Martins, Cyro. 'Campo fora'. 5ª ed. Porto Alegre: Editora Movimento, 1991,  p. 48-49):


                                         
                                            FIM DE BATALHA 
                                                      (Cyro Martins)



         - Stará morto?

         – Bem mortinho! Não stá vendo? Até falta um caco da cabeça.

        O dois guerreiros desviaram aquele, e rumaram para outro lado, banhadal adentro, arqueados à carga de despojos, e ainda farejando inimigos. Sumiram-se, o semblante pesado de ameaça e espreita, encobertos pelas moitas altas de santa-fé. As botas estalando empapadas de água escorregadia das poças minúsculas. As armas de guerra, pendentes das mãos rudes, sulcando o chão mole. E o chapéu derrubado para frente, tapando o sol, ensombrava mais o perfil primitivo daqueles homens.

        Quando despontaram à beira do banhado, as assonâncias da batalha reboavam já quase apagadas, espraiadas na rasura sem eco dos longes.

        E o Jarau, azul e longínquo, atorava ao meio o sol violento de dezembro, encravado no escarlate do poente heróico.

        Noite alta, João Paz acordou.

       Envolvendo-o numa tonteira funda, caía-lhe do céu em cheio na cara estúpida, hipnótica, a enorme brancura lunar, amplificada à fraqueza dos seus olhos mortiços. As moitas de capim, deslinhadas, afiladas e altas, davam-lhe impressões grandiosas de floresta, esmagando-o.

        No topete dos torrões e à flor de espumaradas brancas, bem visíveis à claridade da cheia, avultavam sapos em multidão.

        Pareciam-lhe de tamanhos fabulosos as imóveis, repugnantes, agigantadas rãs. Uma coaxou. Depois outra. E o vozerio a princípio desarmônico e acanhado, subiu preguiçoso, ondulou no ar morno, tomou ritmo, e abriu-se agudo e alucinante na pasmaceira da noite parada.

           Chumbado contra o chão, hirto, não se movia, não pensava.

         Dilatava os olhos mareados e doídos. A custo aflorou à consciência. Esquecido de tudo, não podia supor como fora parar ali.

        Num gesto custoso foi encolhendo devagar os braços, que se mantinham abertos, horizontais, em cruz com o corpo. Ouriçou-se de surpresa e horror, ao apalpar as carnes nuas das coxas, rijas e endurecidas de barro.

           Procurou erguer-se num esforço, para se olhar, para se ver. E caiu, escasso de forças.

         Não enxergava o corpo, porque o torrão que lhe sustinha o pescoço era estreito demais, deixando-lhe pendente a cabeça.

        Apalpava-se, cauteloso e assombrado. Sentiu o peito e os braços ásperos de barro. Levou as mãos à nuca. A melena comprida estava dura e suja de sangue. Aventurou mais as mãos cansadas. E no alto da cabeça, os dedos inchados apertaram a ferida mortal.

        Outra vez derrubou os braços em cruz com o corpo.



                                                                         *  *  * 

2 comentários:

  1. ...traigo
    ecos
    de
    la
    tarde
    callada
    en
    la
    mano
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    una
    vela
    de
    mi
    corazón
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    claveles
    dentro...


    desde mis
    HORAS ROTAS
    Y AULA DE PAZ


    COMPARTIENDO ILUSION
    PEDRO LUSO

    CON saludos de la luna al
    reflejarse en el mar de la
    poesía...




    ESPERO SEAN DE VUESTRO AGRADO EL POST POETIZADO DE THE ARTIST, TITANIC SIÉNTEME DE CRIADAS Y SEÑORAS, FLOR DE PASCUA ENEMIGOS PUBLICOS HÁLITO DESAYUNO CON DIAMANTES TIFÓN PULP FICTION, ESTALLIDO MAMMA MIA,JEAN EYRE , TOQUE DE CANELA, STAR WARS,

    José
    Ramón...

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  2. Olá Cyro! Seus blogs são muito interessantes. Verdadeiras fontes de conhecimento. Parabéns.
    Abraços do Milton!

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muito obrigado pela sua leitura e comentário.
Meu abraço a todos os amigos.

Pedro Luso de Carvalho