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19 de fev. de 2012

[Conto] ERIC NEPOMUCENO – O juramento


   
– PEDRO LUSO DE CARVALHO

ERIC NEPOMUCENO é um conhecido jornalista, escritor e tradutor. Trabalhou no Jornal da Tarde, de São Paulo, colaborou com diversas publicações da Argentina, México e Venezuela. Entre elas, o jornal La Opinión, de Buenos Aires (1973 a 1975), o jornal Excelsior, do México (1974), o jornal El Nacional, de Caracas (1974 a 1975) e a agência de notícias Latin (1974 a 1975). Foi colaborador permanente da revista Crisis, de Buenos Aires (1973 a 1976).
Nepomuceno traduziu ao português vários autores contemporâneos, gigantes da literatura hispânica, como Gabriel García Márquez, Juan Carlos Onetti, Eduardo Galeano, Juan Rulfo, Julio Cortázar, Jorge Luis Borges e outros. Inclusive, seus três primeiros livros foram publicados em espanhol.
Ganhou duas vezes o prêmio Jabuti pela tradução de autores de língua espanhola, além de vários outros prêmios com seus livros de contos e de não-ficção.
Segue O Juramento, conto de Eric Nepomuceno (in Nepomuceno, Eric. A mulher do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1996, p. 10-12):

O JURAMENTO
– ERIC NEPOMUCENO

Era sexta-feira e os quatro estavam sentados no chão de terra, as costas contra as pontas do barranco de argila seca, e o barranco desenhava sombras na estrada poeirenta.
Falavam sobre os últimos dias e de como tinham sido os melhores. A cada fim de férias diziam a mesma coisa. Muitos anos mais tarde, e gostaria que os outros três tivessem uma memória tão dolorida quanto a sua.
Começou a falar sobre aqueles tempos e os tempos de antes e depois. Sentado, as costas contra as pontas do barranco de argila seca, falou sobre os tempos e os três olharam espantados.
Falou do bom de estarem juntos todo o tempo e as coisas que tinham, e do bom que era reconhecer uma árvore pelo tato e pelo cheiro, e os três concordaram.
Falou que aquilo tudo seria perdido um dia e que isso era inevitável: mas que deveriam fazer o possível para levar o máximo de tudo. Sair inteiro, no fim. Falou pela primeira vez da calma amarga que sentia sabendo que as coisas teriam um fim e foi a primeira vez que sentiu essa calma. Depois, se acostumaria com ela. Mas isso os outros três não entenderam naquela hora nem nunca mais.
Falou daquelas coisas e insistiu em que deveriam se proteger, que não deveriam deixar que tudo se perdesse.
Finalmente, falou em um juramento. E como um juramento é solene e os quatro adoravam a solenidade dos cavalheiros, concordaram em ter os pulsos unidos e talhados em cruz, misturando os sangues na garantia de eterna união.
No último instante, em lugar dos pulsos talhados preferiram unir a ponta dos polegares, de onde um pequeno corte mostrava com esforço um pontinho de sangue.
Anos mais tarde, tudo isso é de uma graça amarga porque a honestidade foi estupidamente traída. E agora, cada vez que ele toca a solidão na ponta do polegar direito lamenta – de uma forma ou de outra – que o pulso não tenha nenhuma cicatriz.


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Pedro Luso de Carvalho